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Cinzeiro


Tenho um cinzeiro de vidro, um belo cinzeiro quadrado, um peso monstro permanentemente esquecido no aparador da sala, dado que cá em casa ninguém fuma. Comprei-o a pensar na imensa gente que na altura fumava, e sempre era uma coisa mais apresentável do que lhes indicar o pires do café para largarem a cinza. Agora, já quase ninguém fuma, e os que fumam fogem para a rua, desculpem, que tenho de ir fumar um cigarro, dizem eles com um ar entre a aflição e o de quem vai assaltar alguém à mão armada. E eu fico com um cinzeiro sem serventia nenhuma. E uma máquina de escrever. E discos de vinil. E um abre-cartas. Estou a ficar velha, caramba.


Cristina Nobre Soares

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