Avançar para o conteúdo principal

O Metropolitano

No túnel encurvado ali íamos nós.
à frente, ágil, de casaco de viagem, tu,
e eu, a apanhar-te como um deus veloz
antes que te mudasses em bambu

ou nalguma nova flor branca e vermelha,
e as abas a adejarem com força, eis que se espalha
botão após botão num rasto que assim role
entre o metropolitano e o Albert Hall.

Lua de mel, andar na lua, tarde para os Promenade,
os nossos ecos morrem nesse corredor e agora hei-de
ir como Hansel ia pelas pedrinhas batidas pela lua
refazendo o caminho, apanhando os botões da rua

para acabar nas correntes de ar e na luz frouxa da estação,
partindo os combóios, na via húmida que jaz
a nu e tensa como eu, todo atenção
aos teus passos e a perder-me se olho para trás.



Seamus Heaney
tradução de Vasco Graça Moura

Comentários

Mensagens populares deste blogue

XTERIORS XVII

  Desirée Dolron

O Canavial e o Mar

O que o mar sim ensina ao canavial: o avançar em linha rasteira da onda; o espraiar-se minucioso, de líquido, alagando cova a cova onde se alonga. O que o canavial sim ensina ao mar: a elocução horizontal de seu verso; a geórgica de cordel, ininterrupta, narrada em voz e silêncio paralelos. O que o mar não ensina ao canavial: a veemência passional da preamar; a mão-de-pilão das ondas na areia, moída e miúda, pilada do que pilar. O que o canavial não ensina ao mar: o desmedido do derramar-se da cana; o comedimento do latifúndio do mar, que menos lastradamente se derrama. João Cabral de Melo Neto

Princípios

Podíamos saber um pouco mais da morte. Mas não seria isso que nos faria ter vontade de morrer mais depressa. Podíamos saber um pouco mais da vida. Talvez não precisássemos de viver tanto, quando só o que é preciso é saber que temos de viver. Podíamos saber um pouco mais do amor. Mas não seria isso que nos faria deixar de amar ao saber exactamente o que é o amor, ou amar mais ainda ao descobrir que, mesmo assim, nada sabemos do amor. Nuno Júdice