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Aniversário

Salva-me agora, não desta morte ou de outra
mas de ir vivendo assim seguramente
sem música nem arte, e com o amigo ausente.
No escuro ainda levantei-me e vi
a antiga madrugada que nascia
leve e primeira com a luz macia.
E quem me ouvia, se não os mortos mansos
e generosos sob a lousa fria?
É certo que sonhei que me deixavas
amar e ser amado, como quem
sem mérito nem rosto me fizeste;
mas era de cantor que me mandavas
às portas da cidade ver arder o dia.

António Franco Alexandre

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O Canavial e o Mar

O que o mar sim ensina ao canavial: o avançar em linha rasteira da onda; o espraiar-se minucioso, de líquido, alagando cova a cova onde se alonga. O que o canavial sim ensina ao mar: a elocução horizontal de seu verso; a geórgica de cordel, ininterrupta, narrada em voz e silêncio paralelos. O que o mar não ensina ao canavial: a veemência passional da preamar; a mão-de-pilão das ondas na areia, moída e miúda, pilada do que pilar. O que o canavial não ensina ao mar: o desmedido do derramar-se da cana; o comedimento do latifúndio do mar, que menos lastradamente se derrama. João Cabral de Melo Neto

Princípios

Podíamos saber um pouco mais da morte. Mas não seria isso que nos faria ter vontade de morrer mais depressa. Podíamos saber um pouco mais da vida. Talvez não precisássemos de viver tanto, quando só o que é preciso é saber que temos de viver. Podíamos saber um pouco mais do amor. Mas não seria isso que nos faria deixar de amar ao saber exactamente o que é o amor, ou amar mais ainda ao descobrir que, mesmo assim, nada sabemos do amor. Nuno Júdice